Mulher negra
Quem falou que não devemos ter filhos?
Amar os filhos, ser mãe por amor
Você? Eles? Elas?
Eles dizem que só posso ser ama , mucama, amar somente a dor
Meu corpo minhas regras
Minha rédea
Não sou dele
Não sou deles
Não sou delas
Sou o corpo maltratado, violado, humilhado e estirado nas favelas
Sou mulher negra sim!
Pode me chamar de preta
Não me ofendo com essa treta
Não aliso meu cabelo
Me vejo linda no espelho
Tomo banho de chuveiro
Faço do meu desespero
Força e luta contra o opressor
E como mulher negra
Minha luta é diária
Se moro na favela piso no calo dela
Logo gritam: é favelada!
Se meu cabelo não é liso
Me chamam de relaxada
Se sou mãe solteira
Sou é puta
Se sinto dor no hospital
O médico diz: Você é preta, aguenta dor, espera que sai
Se sou bonita viro globeleza
Corpo deturpado, estuprado, apropriado, pronto pro senhor mexer.
Se entro na loja
Logo vem o segurança
Na militância viro deselegância
Ora mulher branca!
Não me peça sororidade!
Se não andamos juntas pela liberdade
A branquitude nunca desceu o morro
Chorou no morro
Sofreu no morro
Junto aos meus ancestrais
A branquitude já nasce bela
De família singela
Pronta pro amor
E nós?
O que sobra?
É a sobra na senzala
Fazemos uma feijoada, a cultura do afroamor
Pra nós sobra o vestígio
Desse seu racismo
De uma escravidão que nunca acabou.
Aline Buonomo